O esteio do seguro na construção de saídas para o caos climático

O esteio do seguro na construção de saídas para o caos climático

Participação histórica da CNseg na COP30 posiciona o setor como agente central na mitigação e na adaptação às mudanças climáticas em níveis nacional e global.

Por: Vagner Ricardo

Em meio a objetivos ambiciosos, a Casa do Seguro concorre a uma das iniciativas históricas da CNseg para colocar o seguro como uma resposta assertiva às mudanças climáticas no País e no plano global, dando-lhe inclusive centralidade nas políticas públicas.

 

Pela primeira vez nas conferências do clima da ONU, haverá na COP 30 — a ser realizada em Belém, de 10 a 21 de novembro — um espaço de representação do setor de seguros dedicado à promoção do mercado e suas iniciativas relacionadas à agenda de transição climática. A Casa do Seguro (também conhecida como Embaixada do Seguro) foi concebida para promover fóruns de debates, diálogos, plataformas de conexão e relacionamento, experiências imersivas, cerimônias e apresentações culturais e artísticas durante o evento.

 

Numa virada histórica para o setor, a CNseg planeja posicionar o seguro como um ator central na agenda global de adaptação e mitigação às mudanças climáticas. A Casa do Seguro é uma iniciativa-chave para essa ofensiva na COP30 e vai funcionar em um espaço multifuncional com mais de 1,6 mil metros quadrados.

“Mais do que uma estrutura física, a Casa do Seguro representa uma mudança de mindset para tornar o setor de seguros um agente fundamental e indispensável na construção de soluções para um futuro mais resiliente”, afirma o presidente da CNseg, Dyogo Oliveira.

 

Ele reconhece que há avanço no protagonismo do mercado na pauta da sustentabilidade e das mudanças climáticas. Nesse sentido, lembra que, em seguidos encontros realizados neste ano, o setor foi destacado como essencial na agenda climática por diversas autoridades. Para consolidar esse papel, contudo, é necessário que o documento final da COP30 mencione o setor de seguros como fundamental na mitigação de impactos das mudanças climáticas e como pilar da descarbonização.

 

O presidente da COP30, embaixador André Corrêa do Lago, inclusive, tem destacado a relevância do mercado segurador em seguidos eventos, como nas chamadas “Cartas da Presidência”, documentos que cumprem o papel de comunicar as principais mensagens da Presidência da Conferência.

 

“Como presidente da COP, o embaixador tem a responsabilidade de conduzir os trabalhos e de consolidar a visão das negociações. Em suas cartas, ele aponta avanços e prioridades, e já fez, de forma inédita, menção ao setor de seguros”, assinala o presidente da CNseg.

 

CÍRCULO VIRTUOSO

 

Para Dyogo Oliveira, a menção do seguro no documento final da COP30 abrirá portas para concretizar um antigo pleito do mercado segurador: sua inscrição nas políticas públicas. “A presença do seguro na Conferência tem exatamente esse objetivo: consolidar o setor como parceiro estratégico na formulação de políticas públicas relacionadas às mudanças climáticas. Ao reconhecer o seguro como aliado nesse processo, autoridades ampliam a eficiência das políticas públicas e abrem espaço para soluções inovadoras que beneficiem a sociedade”, afirma.

 

Oliveira acrescenta que esse movimento cria um círculo virtuoso, em que todos ganham: o setor, ao expandir sua atuação, e o poder público, ao ter um instrumento essencial de mitigação de riscos. E os resultados já começam a aparecer. O ministro dos Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho, solicitou uma proposta para a criação de um seguro climático capaz de proteger os aeroportos brasileiros. Essa aproximação confirma que o setor de seguros está avançando na direção certa e é reconhecido como parceiro indispensável para tornar as políticas públicas mais eficazes.

 

Entre as frentes de batalhas no campo da sustentabilidade e das mudanças climáticas identificadas pelo presidente da CNseg, está a gestão de riscos climáticos, cada vez mais desafiadores, cujo alcance da proteção de seguros precisa ser ampliado. Nesse sentido, ele ressalta o gap de proteção ocorrido na tragédia do Rio Grande do Sul, em 2024, que gerou perdas econômicas de mais de R$ 100 bilhões — apenas 6% foram indenizadas por seguradoras. Essa taxa de proteção está muito abaixo da média internacional, de 40%.

 

“As pessoas hoje enfrentam mais riscos climáticos em suas vidas: enchentes, secas, granizos e vendavais, e esse risco está nas residências, nos veículos, na agricultura e na infraestrutura. O mundo ideal teria 100% das perdas econômicas seguradas”, defende ele, ratificando que a tarefa do mercado é absorver mais riscos das pessoas, permitindo que elas deem continuidade à sua vida.

 

No campo, a presença crescente do seguro permitirá ao produtor rural que perder uma safra voltar a comprar, no ano seguinte, sementes, fertilizantes e defensivos e preparar a terra para produzir.
São vários os exemplos de como ampliar a presença do seguro na sociedade, ao criar produtos climáticos ou ampliar o consumo dos já existentes. Incluem-se aí coberturas específicas para a infraestrutura pública logística do Brasil: rodovias, ferrovias, portos e aeroportos, que praticamente não têm a proteção dos seguros.

 

Outra expertise do mercado, ainda subaproveitada, refere-se à gestão e à mitigação de riscos. Para Dyogo Oliveira, esse segundo pilar, extremamente importante, mostra à sociedade que o setor de seguros tem experiência e capacidade consolidadas de gestão de riscos.

 

“Somos capazes de avaliar edifícios, fábricas, pontes e rodovias, ou qualquer grande projeto de infraestrutura, e de identificar, desde sua concepção, quais os riscos presentes e que medidas devem ser tomadas para evitá-los”, afirma.

 

IMPACTOS REDUZIDOS

 

Esse conhecimento acumulado permite ao mercado apoiar clientes e autoridades na adoção de ações preventivas e mitigadoras, garantindo que, mesmo diante de um desastre natural, os impactos sejam reduzidos. Para Dyogo Oliveira, trata-se de um papel estratégico: o seguro não atua apenas na reparação de perdas, mas, sobretudo, como sinalizador para a sociedade, indicando onde e como construir de forma mais segura e sustentável.

 

“Em muitos países, já se vê a inviabilidade de seguros em regiões de risco extremo. Essa realidade é um alerta claro de que precisamos integrar a expertise do setor às decisões de planejamento e às políticas públicas, sob pena de tornarmos inviáveis atividades essenciais. É esse o valor que o mercado segurador oferece: prevenir, proteger e orientar a sociedade rumo a escolhas mais responsáveis e resilientes”, pontua.

 

Por fim, o mercado consta como um dos mais importantes investidores institucionais: são cerca de R$ 2,3 trilhões de ativos financeiros. O presidente da CNseg destacou o papel estratégico do setor de seguros como investidor no contexto da transição climática, afirmando que as seguradoras, por obrigação regulatória e pela natureza do negócio, acumulam reservas técnicas que podem ser direcionadas a iniciativas de impacto positivo.

 

“O setor de seguros acumula obrigatoriamente reservas, dada a natureza do negócio em si. Essas reservas podem ser aplicadas em projetos e investimentos sustentáveis para ajudar a desenvolver essa transição econômica, que também é extremamente necessária”, afirmou.

 

Ele ressaltou, no entanto, que esses recursos não pertencem às seguradoras, mas aos clientes. “É preciso lembrar que a seguradora não é dona desse dinheiro, ela forma reservas técnicas, acumuladas em benefício do segurado. Então, esses investimentos precisam ser feitos com muita cautela, em ativos realmente muito seguros, com liquidez e rentabilidade muito claras”, disse.

 

De acordo com o presidente da CNseg, muitas companhias já vêm buscando caminhos nesse sentido. “Tem buscado investimentos em green bonds, em ativos sustentáveis, mas isso é feito com muito cuidado, para resguardar os recursos que garantem o pagamento aos clientes”, observou.

 

O dirigente da CNseg observa que é hora de agir coletivamente para garantir que o setor de seguros seja visível e valorizado no arcabouço global das políticas climáticas — mas isso representa oportunidades e desafios. A intensificação dos eventos climáticos ameaça a sustentabilidade técnica do seguro, se não forem incorporadas práticas inovadoras e coope­ração entre os entes públicos e privados para o mercado se adaptar a uma nova era de incertezas. Hoje, lembra ele, já existem desertos de seguros no plano global — áreas sem cobertura em virtude de riscos elevados — algo que não está descartado no Brasil em resposta ao custo da inação.

 

“O setor de seguros é um instrumento à disposição da sociedade e está buscando diálogo com o Executivo, o Legislativo, o Judiciário e a sociedade civil. Não há a menor dúvida de que a inação será severamente punida, por isso, agimos ativamente em busca de soluções”, declarou.

 

HUB DE DADOS

 

A Casa do Seguro dá início ao trabalho de ampliação das coberturas de seguros em âmbito global, uma necessidade ainda mais relevante no Brasil. “O País tem enfrentado eventos climáticos com frequência alarmante: de três a quatro por dia. Nos últimos dez anos, 95% dos municípios brasileiros decretaram estado de calamidade ou emergência em razão de desastres naturais. As perdas econômicas neste período, sem considerar a tragédia no RS, ultrapassaram R$ 300 bilhões. É um fenômeno recorrente, severo e impactante, que não pode ser tratado como novo normal, mas sim como um novo anormal”, assinalou.

 

O aquecimento global já elevou em 1,5ºC a temperatura média do planeta, e o volume de emissões continuará crescendo e trazendo implicações graves e duradouras. Nesse cenário, é preciso preparar a sociedade para um futuro inevitavelmente mais desafiador. “O setor de seguros é, sem dúvida, uma das ferramentas mais eficazes para fortalecer a resiliência e apoiar a adaptação da sociedade a essa nova realidade climática”, declara.

 

Durante a COP30, a CNseg lançará oficialmente um hub de dados socioambientais e climáticos, desenvolvido em parceria com a Universidade Federal de São João del Rei (UFSJ), que objetiva integrar informações científicas, socioeconômicas e ambientais para apoiar seguradoras, gestores públicos e investidores na precificação de riscos e no planejamento de estratégias de adaptação e mitigação.

 

O hub permitirá consultas detalhadas por CPF, CNPJ, endereço, CEP ou coordenadas, oferecendo análises baseadas em inteligência artificial, Big Data e Data Science. Inicialmente, o foco estará nos riscos de inundações e em análises socioambientais que cruzam dados de 18 fontes, incluindo desmatamento e vulnerabilidade social.

 

Trata-se de uma ferramenta fundamental para avaliar impactos estimados de eventos climáticos, estabelecendo metodologias confiáveis para orientar investimentos, reduzir danos e aumentar a resiliência de comunidades e projetos de infraestrutura. Sim, um instrumento decisivo para uma transição climática justa e para a proteção da população mais vulnerável